Mar que ouvi sempre cantar murmúrios Na doce queixa das elegias, Como se fosses, nas tardes frias De tons purpúreos, A voz das minhas melancolias: Com que delícia neste infortúnio, Com que selvagem, profundo gozo, Hoje te vejo bater raivoso, Na maré-cheia de novilúnio, Mar rumoroso! Com que amargura mordes a areia, Cuspindo a baba da acre salsugem, No torvelinho de ondas que rugem Na maré-cheia, Mar de sargaços e de amuragem! As minhas cóleras homicidas, Meus velhos ódios de iconoclasta, Quedam-se absortos diante da vasta, Pérfida vaga que tudo arrasta, Mar que intimidas! Em tuas ondas precipitadas, Onde flamejam lampejos ruivos, Gemem sereias despedaçadas, Em longos uivos Multiplicados pelas quebradas. Mar que arremetes, mas que não cansas, Mar de blasfêmias e de vinganças, Como te invejo! Dentro em meu peito Eu trago um pântano insatisfeito De corrompidas desesperanças!... 1913