A vida ia tomando forma e cor, rompia... Eu estava tão presa a ti, que não sabia Onde acabava eu e começavas tu. Mas ela mesma, a vida, a borbulhar selvagem No uivo dos animais, no viço da folhagem — Em tudo, no teu corpo e no meu corpo nu — Ela mesma nos separou. As cordilheiras Afundaram no oceano. As vozes derradeiras Dos bichos que no abismo iam todos morrer, Enchiam-me de assombro... E conheci na treva A maior dor, a dor da força que me leva Para longe de ti. Meu ser pelo teu ser Clamou... Clamou debalde. Em mim subitamente Tudo descorou, tudo envelheceu. Ao quente Meu coração de outrora, hoje tarde reflui Um sangue pobre em que já não palpita nada. Como a planta sem ar, murchei. Branca e gelada, Não sou mais do que uma lembrança do que fui. Embora! Testemunhei eu só, aquela Que trouxe a vida em si mais luminosa e bela Do que nunca a sonhaste, a glória deste amor. Terás em mim, a que foi tua, ora uma estranha, A única face que te observa e té acompanha Da funda escuridão cada dia maior... * Poema desentranhado de uma página em prosa da escritora Dinah Silveira de Queiroz.