I Embala-me, balanço da mangueira, Embala-me, que enquanto vou contigo, Contigo venho, o meu pesar esqueço. Rompe a luz da manhã rosada e linda, Tudo desperta. E essa por quem padeço, Lânguida e preguiçosa, Entre brancos lençóis repousa ainda. Embala-me, pendente da mangueira, Na tensa corda, meu balanço amigo! Em claro a noite inteira Passei, pensando nela. Ah! que formosa Estava ontem à tarde no mirante, Um livro ao colo, às tranças uma rosa, E o olhar perdido na amplidão distante! Pensava... Em quem pensava? Se fosse em mim... Como formosa estava! Oh! não pausado e manso, Mas aos arrancos, estirado voa, Leva-me, meu balanço! II Assim cismando, à toa, Olhos voltados já para a querida Visão de Laura, já para o céu claro, Para o campo e arredores, A manhã passo. Sobre a serra erguida Em frente nasce e, coroando-a, brilha O sol. Loureja o ipê com as áureas flores. Late nos grotões fundos, indo ao faro Da caça, ao buzinar dos caçadores, Da fazenda a matilha. E no ar que sopra dos capões escuros, Sente-se, de mistura a essências finas E ao cheiro das resinas, Um sabor acre de cajás maduros. III Cajás! Não é que lembra à Laura um dia (Que dia claro! esplende o mato e cheira!) Chamar-me para em sua companhia Saboreá-los sob a cajazeira! — Vamos sós? perguntei-lhe. E a feiticeira: — Então! tens medo de ir comigo? — E ria. Compõe as tranças, salta-me ligeira Ao braço, o braço no meu braço enfia. — Uma carreira! — Uma carreira! — Aposto! A um sinal breve dado de partida, Corremos. Zune o vento em nosso rosto. Mas eu me deixo atrás ficar, correndo, Pois mais vale que a aposta da corrida Ver-lhe as saias a voar, como vou vendo. Imagem - 00020004 Publicado no livro Poesias: segunda série. Poema integrante da série Alma em Flor, 1900. In: OLIVEIRA, Alberto de. Poesias completas. Ed. crít. Marco Aurélio Mello Reis. Rio de Janeiro: Núcleo Ed. da UERJ, 1978. v.2. (Fluminense) NOTA: Alma em Flor é composto de 3 cantos. O terceiro tem 17 parte