Chorava o menino. Para a mãe, coitada, Jesus pequenito, De qualquer maneira (Mães o sabem...), era Das entranhas dela O fruto bendito. José, seu marido, Ah esse aceitava, Carpinteiro simples, O que Deus mandava. Conhecia o filho À que vinha neste Mundo tão bonito, Tão mal habitado? Não que ele temesse O humano flagício: O fele o vinagre, Escárnios, açoites, O lenho nos ombros, A lança na ilharga, A morte na cruz. Mais do que tudo isso O amedrontaria A dor de ser homem, O horror de ser homem, — Esse bicho estranho Que desarrazoa Muito presumido De sua razão; — Esse bicho estranho Que se agita em vão; Que tudo deseja Sabendo que tudo É o mesmo que nada; — Esse bicho estranho Que tortura os que ama; Que até mata, estúpido, Ao seu semelhante No ilusivo intento De fazer o bem! Os anjos cantavam Que o menino viera Para redimir O homem — essa absurda Imagem de Deus! Mas o jumentinho, Tão manso e calado Naquele inefável, Divino momento, Ele bem sabia Que inútil seria Todo o sofrimento No Sinédrio, no horto, Nos cravos da cruz; Que inútil seria O fele vinagre Do bestial flagício; Ele bem sabia Que seria inútil O maior milagre; Que inútil seria Todo sacrifício... 1949