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Sim, sou eu, eu mesmo, tal qual resultei de tudo,

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Este poema de Álvaro de Campos retrata a complexidade e a dualidade da identidade do eu lírico. O poeta expressa a sua própria existência como um resultado de todas as experiências vividas, tanto as positivas quanto as negativas. Há uma sensação de desapego e de ser apenas um acessório ou sobresselente da sua própria emoção sincera. O eu lírico reflete sobre as suas ações passadas, os seus desejos e amores, e como tudo isso o moldou. No entanto, também há uma sensação de desconexão e de não se reconhecer completamente, como se houvesse algo melhor dentro de si. O poema transmite uma mistura de impressões, desde a inconsequência até a dor, e termina com a aceitação de que o eu lírico é o que é, mesmo que seja uma charada indecifrável para os outros. Este poema pode ser partilhado em momentos de reflexão sobre a identidade e a complexidade humana. Convido-te a explorar mais poemas no website www.poetmi.com.

Sim, sou eu, eu mesmo, tal qual resultei de tudo,

Um Poema de Álvaro de Campos

Sim, sou eu, eu mesmo, tal qual resultei de tudo,

Espécie de acessório ou sobresselente próprio,

Arredores irregulares da minha emoção sincera,

Sou eu aqui em mim, sou eu.


Quanto fui, quanto não fui, tudo isso sou.

Quanto quis, quanto não quis, tudo isso me forma.

Quanto amei ou deixei de amar é a mesma saudade em mim.


E ao mesmo tempo, a impressão, um pouco inconsequente,

Como de um sonho formado sobre realidades mistas,

De me ter deixado, a mim, num banco de carro eléctrico,

Para ser encontrado pelo acaso de quem se lhe ir sentar em cima.


E, ao mesmo tempo, a impressão, um pouco longínqua,

Como de um sonho que se quer lembrar na penumbra a que se acorda,

De haver melhor em mim do que eu.


Sim, ao mesmo tempo, o impressão, um pouco dolorosa,

Como de um acordar sem sonhos para um dia de muitos credores,

De haver falhado tudo como tropeçar no capacho,

De haver embrulhado tudo como a mala sem as escovas,

De haver substituído qualquer coisa a mim algures na vida.


Baste! É a impressão um tanto ou quanto metafísica,

Como o sol pela última vez sobre a janela da casa a abandonar,

E que mais vale ser criança que querer compreender o mundo –

A impressão de pão com manteiga e brinquedos,

De um grande sossego sem Jardins de Prosérpina,

De uma boa vontade para com a vida encostada de testa à janela,

Num ver chover com som lá fora

E não as lágrimas mortas de custar a engolir.


Baste, sim baste! Sou eu mesmo, o trocado,

O emissário sem carta nem credenciais,

O palhaço sem riso, o bobo com o grande fato de outro,

A quem tinem as campainhas da cabeça

Como chocalhos pequenos de uma servidão em cima.


Sou eu mesmo, a charada sincopada

Que ninguém da roda decifra nos serões de província.


Sou eu mesmo, que remédio!...


06/08/1931

No poetmi desde 2022-10-07 01:37:27

Álvaro de Campos in Poesias de Álvaro de Campos


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Álvaro de Campos

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