Não sem lei, mas segundo leis diversas Entre os homens reparte o fado e os deuses Sem justiça ou injustiça Prazeres, dores, gozos e perigos. Bem ou mal, não terás o que mereces. Querem os deuses a isto obrigar Porque o Fado não tem Leis nossas com que reja a sua lei. Quem é rei hoje, amanhã escravo cruza Com o escravo de ontem que é depois rei. Sem razão um caiu, Sem causa nele o outro ascenderá. Não em nós, mas dos deuses no capricho E nas sombras p'ra além do seu domínio Está o que somos, e temos, A vida e a morte do que somos nós. Se te apraz mereceres, que te apraza Por mereceres, não porque te o Fado Dê o prémio ou a paga De com constância haveres merecido. Dúbia é a vida, inconstante o que a governa. O que esperamos nem sempre acontece Nem nos falece sempre, Nem há com que a alma uma ou outra cousa espere. Torna teu coração digno dos deuses E deixa a vida incerta ser quem seja. O que te acontecer Aceita. Os deuses nunca se rebelam. Nas mãos inevitáveis do destino A roda rápida soterra hoje Quem ontem viu o céu Do transitório auge do seu giro.