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Esta velha angústia,

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Este poema de Álvaro de Campos retrata uma angústia antiga que transborda na forma de lágrimas, imaginações e emoções súbitas. O eu lírico expressa a dificuldade de lidar com esse desconforto e deseja enlouquecer de verdade. Ele se sente como um internado em um manicômio, mesmo sem estar em um. O poema reflete a sensação de estar entre, de quase ser algo, mas não conseguir alcançar. O eu lírico lamenta a perda da inocência da infância e questiona sua identidade atual. Ele deseja ter uma religião para acreditar, qualquer uma serviria, pois tudo é apenas o que pensamos sobre tudo. O poema termina com um apelo ao coração de vidro pintado para estalar. Este poema pode ser partilhado em momentos de reflexão sobre a angústia existencial, a busca por identidade e a dificuldade de lidar com as emoções. Convido-te a explorar outros poemas no website www.poetmi.com.

Esta velha angústia,

Um Poema de Álvaro de Campos

Esta velha angústia,

Esta angústia que trago há séculos em mim,

Transbordou da vasilha,

Em lágrimas, em grandes imaginações,

Em sonhos em estilo de pesadelo sem terror,

Em grandes emoções súbitas sem sentido nenhum.


Transbordou.

Mal sei como conduzir-me na vida

Com este mal-estar a fazer-me pregas na alma!

Se ao menos endoidecesse deveras!

Mas não: é este estar entre,

Este quase,

Este poder ser que...,

Isto.


Um internado num manicómio é, ao menos, alguém,

Eu sou um internado num manicómio sem manicómio.

Estou doido a frio,

Estou lúcido e louco,

Estou alheio a tudo e igual a todos:

Estou dormindo desperto com sonhos que são loucura

Porque não são sonhos

Estou assim...


Pobre velha casa da minha infância perdida!

Quem te diria que eu me desacolhesse tanto!

Que é do teu menino? Está maluco.

Que é de quem dormia sossegado sob o teu tecto provinciano?

Está maluco.

Quem de quem fui? Está maluco. Hoje é quem eu sou.


Se ao menos eu tivesse uma religião qualquer!

Por exemplo, por aquele manipanso

Que havia em casa, lá nessa, trazido de África.

Era feiíssimo, era grotesco,

Mas havia nele a divindade de tudo em que se crê.

Se eu pudesse crer num manipanso qualquer –

Júpiter, Jeová, a Humanidade –

Qualquer serviria,

Pois o que é tudo senão o que pensamos de tudo?


Estala, coração de vidro pintado!


16/06/1934

No poetmi desde 2022-10-07 01:37:27

Álvaro de Campos in Poesias de Álvaro de Campos


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Álvaro de Campos

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