Raimundo Correia
Raimundo Correia (Raymundo Correia) ocupa um dos mais altos postos na poesia brasileira. Seu livro de estreia, Primeiros sonhos (1879) insere-se ainda no Romantismo. Já em Sinfonias (1883) nota-se o feitio novo que seria definitivo em sua obra o Parnasianismo. Segundo os cânones dessa escola, que estabelecem uma estética de rigor formal, ele foi um dos mais perfeitos poetas da língua portuguesa, formando com Alberto de Oliveira e Olavo Bilac a famosa Trindade Parnasiana. Além de poesia, deixou obras de crítica, ensaio e crônicas.
Raimundo Correia
Se a cólera que espuma, a dor que mora N'alma, e destrói cada ilusão que nasce Tudo o que punge, tudo o que devora O coração, no rosto se estampasse; Se se pudesse, o espírito que chora, Ver através da máscara da face, Quanta gente, talvez, que inveja agora Nos causa, então piedade nos causasse! Quanta gente que ri, talvez, consigo Guarda um atroz, recôndito inimigo Como invisível chaga cancerosa! Quanta gente que ri, talvez existe, Cuja ventura única consiste Em parecer aos outros venturosa!
Raimundo Correia
Vai-se a primeira pomba despertada... Vai-se outra mais... mais outra... enfim dezenas De pombas vão-se dos pombais, apenas Raia sanguínea e fresca a madrugada... E à tarde, quando a rígida nortada Sopra, aos pombais de novo elas, serenas, Ruflando as asas, sacudindo as penas, Voltam todas em bando e em revoada... Também dos corações onde abotoam, Os sonhos, um por um, céleres voam, Como voam as pombas dos pombais; No azul da adolescência as asas soltam, Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam, E eles aos corações não voltam mais...
Raimundo Correia
Raiava, ao longe, em fogo a lua nova, Lembras-te?... apenas reluzia a medo, Na escuridão crepuscular da alcova O diamante que ardia-te no dedo... Nesse ambiente tépido, enervante, Os meus desejos quentes, irritados, Circulavam-te a carne palpitante, Como um bando de lobos esfaimados... Como que estava sobre nós suspensa A pomba da volúpia; a treva densa Do teu olhar tinha tamanho brilho! E os teus seios que as roupas comprimiam, Tanto sob elas, túmidos, batiam, Que estalavam-te o flácido espartilho!
Raimundo Correia
A Adelino Fontoura Esbraseia o Ocidente na agonia O sol... Aves em bandos destacados, Por céus de oiro e de púrpura raiados Fogem... Fecha-se a pálpebra do dia... Delineiam-se, além, da serrania Os vértices de chama aureolados, E em tudo, em torno, esbatem derramados Uns tons suaves de melancolia... Um mundo de vapores no ar flutua... Como uma informe nódoa, avulta e cresce A sombra à proporção que a luz recua... A natureza apática esmaece... Pouco a pouco, entre as árvores, a lua Surge trêmula, trêmula... Anoitece. Publicado no livro Sinfonias (1883).
Raimundo Correia
Vogar mais não vale a pena, Amarra o barco a esta bóia; Não traves por outra Helena Segunda guerra de Tróia. Ouve um conselho de amigo: Deixa de muito escolher; Eu das mulheres só digo O que ouço a todos dizer. Dizem de Cora que, quando Entra nos bailes, namora, Valsa demais, e, valsando A perna mostra, e... não cora; Nem por ver, dessa maneira, Que a perna que mostra, em vão, Não é de osso e carne inteira, Mas metade de... algodão. De Pacífica, que à-toa Sem razão se assanha e briga; E de Modesta (perdoa)! Que traz o rei na barriga... Prudência — em nada é cordata; Benigna — maus modos tem; E ao noivo de Fortunata A sorte grande não vem. Os papalvos certos ficam De que não são, nem metade Do que seus nomes indicam, Severa e Felicidade: Aquela — vale um pagode; E desta outra o vulgo diz, Que é feliz, como se pode Na desgraça ser feliz; Plácida — é plácida e mansa, Como onça ou como leoa; E é, bem sabes, Esperança O desespero em pessoa. Inocência — de pecados Está cheia, como vês; Diferentes namorados Tem Constância, em cada mês; Muito avara é — Generosa; Angélica — é muito ingrata; E até, com língua maldosa, Dizem que Branca é... mulata. Rosa é bela? Embora o seja, (Se nos espinhos não for) Semelhante, há lá quem veja, Mulher-rosa à rosa-flor?! E pois, que inda em tempo chego Com meus conselhos: — se queres Ter na vida mais sossego, Deixa em sossego as mulheres. Ao pé da letra as não tomes, Porque as mulheres estão, Até com seus próprios nomes, Em viva... contradição. Poema integrante da série Poesias Avulsas.
Raimundo Correia
Eu amo os gregos tipos de escultura: Pagãs nuas no mármore entalhadas; Não essas produções que a estufa escura Das modas cria, tortas e enfezadas. Quero um pleno esplendor, viço e frescura Os corpos nus; as linhas onduladas Livres: de carne exuberante e pura Todas as saliências destacadas... Não quero, a Vênus opulenta e bela De luxuriantes formas, entrevê-la De transparente túnica através: Quero vê-la, sem pejo, sem receios, Os braços nus, o dorso nu, os seios Nus... toda nua, da cabeça aos pés!
Raimundo Correia
Num recesso da selva ínvia e sombria, Estrelada de flores, vicejante, Onde um rio entre seixos, espumante, Cursando o vale, túrgido, fluía; A coma esparsa, lívido o semblante, Desvairados os olhos, como fria Aparição dos túmulos, um dia Surgiu de Hamlet a lacrimosa amante; Símplices flores o seu porte lindo Ornavam... como um pranto, iam caindo As folhas de um salgueiro na corrente... E na corrente ela também tombando, Foi-se-lhe o corpo alvíssimo boiando Por sobre as águas indolentemente. Publicado no livro Sinfonias (1882). Primeiro da série Perfis Românticos, constituída por oito sonetos.
Raimundo Correia
Ó Marília! Ó Dirceu! Eram dois ninhos Os vossos corações, ninhos de flores; Mas, entre os quais, sentíeis os rigores Lacerantes de incógnitos espinhos; Tremiam, como em flácidos arminhos, Promiscuamente, neles os amores, As saudades, os cânticos, as dores, Como uma multidão de passarinhos... O sulco profundíssimo que traça Nos corações amantes a desgraça, Ambos nos corações traçados vistes, Quando os vossos olhares, no momento, Cruzaram-se, do negro afastamento, Marejados de lágrimas e tristes... Poema integrante da série Perfis Românticos.
Raimundo Correia
Visões que n'alma o céu do exílio incuba, Mortais visões! Fuzila o azul infando... Coleia, basilisco de ouro, ondeando O Níger... Bramem leões de fulva juba... Uivam chacais... Ressoa a fera tuba Dos cafres, pelas grotas retumbando, E a estralada das árvores, que um bando De paquidermes colossais derruba... Como o guaraz nas rubras penas dorme, Dorme em nimbos de sangue o sol oculto... Fuma o saibro africano incandescente... Vai co'a sombra crescendo o vulto enorme Do baobá... E cresce n'alma o vulto De uma tristeza, imensa, imensamente...
Raimundo Correia
Agrada à vista e à fantasia agrada Ver-te, através do prisma de diamantes Da chuva, assim ferida e atravessada Do sol pelos venábulos radiantes... Vais e molhas-te, embora os pés levantes: – Par de pombos, que a ponta delicada Dos bicos metem nágua e, doidejantes, Bebem nos regos cheios da calçada... Vais, e, apesar do guarda-chuva aberto, Borrifando-te colmam-te as goteiras De pérolas o manto mal coberto; E estrelas mil cravejam-te, fagueiras, Estrelas falsas, mas que assim de perto, Rutilam tanto, como as verdadeiras... Publicado no livro Versos e Versões (1887).
Raimundo Correia
Enquanto a chuva cai, grossa e torrencial, Lá fora; e enquanto, ó bela! A lufada glacial Tamborila a bater nos vidros da janela; Dentro, esse áureo torçal Do cabelo que, rico, em ondas se encapela, Deslaça; e o alvor ideal Do teu corpo à avidez do meu olhar revela; Porque, à avidez do olhar Do amante, é grato, ao menos, Destas noites no longo e monótono curso, — Claro como o luar — Ver um busto de Vênus Surgir dentre as lãs e dentre as peles de urso. Publicado no livro Versos e Versões, 1883/1886 (1887).
Raimundo Correia
Além nos ares, tremulamente, Que visão branca das nuvens sai! Luz entre as franças, fria e silente; Assim nos ares, tremulamente, Balão aceso subindo vai... Há tantos olhos nela arroubados, No magnetismo do seu fulgor! Lua dos tristes e enamorados, Golfão de cismas fascinador! Astro dos loucos, sol da demência, Vaga, notâmbula aparição! Quantos, bebendo-te a refulgência, Quantos por isso, sol da demência, Lua dos loucos, loucos estão! Quantos à noite, de alva sereia O falaz canto na febre a ouvir, No argênteo fluxo da lua cheia, Alucinados se deixam ir... Também outrora, num mar de lua, Voguei na esteira de um louco ideal; Exposta aos euros a fronte nua, Dei-me ao relento, num mar de lua, Banhos de lua que fazem mal. Ah! Quantas vezes, absorto nela, Por horas mortas postar-me vim Cogitabundo, triste, à janela, Tardas vigílias passando assim! E assim, fitando-a noites inteiras; Seu disco argênteo n’alma imprimi; Olhos pisados, fundas olheiras, Passei fitando-a noites inteiras, Fitei-a tanto, que enlouqueci! Tantos serenos tão doentios, Friagens tantas padeci eu; Chuva de raios de prata frios A fronte em brasa me arrefeceu! Lunárias flores, ao feral lume, – Caçoilas de ópio, de embriaguez – Evaporavam letal perfume... E os lençóis d’água, do feral lume Se amortalhavam na lividez... Fúlgida névoa vem-me ofuscante De um pesadelo de luz encher, E a tudo em roda, desde esse instante, Da cor da lua começo a ver. E erguem por vias enluaradas Minhas sandálias chispas e flux... Há pó de estrelas pelas estradas... E por estradas enluaradas Eu sigo às tontas, cego de luz... Um luar amplo me inunda, e eu ando Em visionária luz a nadar, Por toda a parte, louco arrastando O largo manto do meu luar... Publicado no livro Poesias (1898).
Raimundo Correia
Doire a Poesia a escura realidade E a mim a encubra! Um visionário ardente Quis vê-la nua um dia; e, ousadamente, Do áureo manto despoja a divindade; O estema da perpétua mocidade Tira-lhe e as galas; e ei-la, de repente, Inteiramente nua e inteiramente Crua, como a Verdade! E era a Verdade! Fita-a em seguida, e atônito recua... — Ó Musa! exclama então, magoado e triste, Traja de novo a louçainha tua! Veste outra vez as roupas que despiste! Que olhar se apraz em ver-te assim tão nua?... À nudez da Verdade quem resiste?!
Raimundo Correia
Ilha de atrozes degredos! Cinge um muro de rochedos Seus flancos. Grosso a espumar Contra a dura penedia, Bate, arrebenta, assobia, Retumba, estrondeia o mar. Em circuito, o Horror impera; No centro, abrindo a cratera Flagrante, arroja um volcão Ígnea blasfêmia às alturas... E, nas ínvias espessuras, Brame o tigre, urra o leão. Aqui chora, aqui, proscrita, Clama e desespera aflita A alma de si mesma algoz, Buscando na imensa plaga, Entre mil vagas, a vaga, Que neste exílio a depôs. Se a vida a prende à matéria, Fora desta, a alma, sidérea, Radia em pleno candor; O corpo, escravo dos vícios, É que teme os precipícios, Que este mar cava em redor. No azul eterno ela busca, No azul, cujo brilho a ofusca, Pairar, incendida ao sol, Despindo a crusta vil, onde Se esconde, como se esconde A lesma em seu caracol. Contempla o infinito ... Um bando De gerifaltos voando Passou, desapareceu No éter azul, na água verde... E onde esse bando se perde, seu longo olhar se perde... Contempla o mar, silenciosa: Ora mansa, ora raivosa, Vai e vem a onda minaz, E entre as pontas do arrecife, Às vezes leva um esquife, Às vezes um berço traz. Contempla, de olhos magoados, Tudo... Muitos degredados Findo o seu degredo têm; Vão-se na onda intumescida Da Morte, mas na da Vida, Novos degredados vêm. Ó alma contemplativa ! Vem já, decumana e altiva, Entre as ondas talvez, A que, no supremo esforço Da morte, em seu frio dorso, Te leve ao largo, outra vez. Quanto esplendor! São aquelas As regiões de luz, que anelas, Rompe os rígidos grilhões, Com que à Carne de agrilhoa O instinto vital! E voa, e voa àquelas regiões!...
Raimundo Correia
Rondo pela noite Imaginando mil coisas Meditando sozinho Até a madrugada Isto tudo é tão contrário Medo e coragem Amor e ódio Revolta e compreensão Mas nada rima nesse mundo Apenas eu e você restávamos Resto do que o mundo já foi Intensamente, imensamente, eternamente Até mesmo nós sucumbimos Reavaliamos nossa condição Indiferentes, deixamos de rimar Menos um casal no mundo Agora ando sozinho Meditando noite adentro Imaginando e esquecendo mil e uma coisas Rondando até a madrugada
Raimundo Correia
Aqui outrora retumbaram hinos; Muito coche real nestas calçadas E nestas praças, hoje abandonadas, Rodou por entre os ouropéis mais finos... Arcos de flores, fachos purpurinos, Trons festivais, bandeiras desfraldadas, Girândolas, clarins, atropeladas Legiões de povo, bimbalhar de sinos... Tudo passou! Mas dessas arcarias Negras, e desses torreões medonhos, Alguém se assenta sobre as lájeas frias; E em torno os olhos úmidos, tristonhos, Espraia, e chora, como Jeremias, Sobre a Jerusalém de tantos sonhos!...
Raimundo Correia
Ser moça e bela ser, por que é que lhe não basta? Porque tudo o que tem de fresco e virgem gasta E destrói? Porque atrás de uma vaga esperança Fátua, aérea e fugaz, frenética se lança A voar, a voar?... Também a borboleta, Mal rompe a ninfa, o estojo abrindo, ávida e inquieta, As antenas agita, ensaia o vôo, adeja; O finíssimo pó das asas espaneja; Pouco habituada à luz, a luz logo a embriaga; Bóia do sol na morna e rutilante vaga; Em grandes doses bebe o azul; tonta, espairece No éter; voa em redor, vai e vem; sobe e desce; Torna a subir e torna a descer; e ora gira Contra as correntes do ar, ora, incauta, se atira Contra o tojo e os sarcais; nas puas lancinantes Em pedaços faz logo às asas cintilantes; Da tênue escama de ouro os resquícios mesquinhos Presos lhe vão ficando à ponta dos espinhos; Uma porção de si deixa por onde passa, E, enquanto há vida ainda, esvoaça, esvoaça, Como um leve papel solto à mercê do vento; Pousa aqui, voa além, até vir o momento Em que de todo, enfim, se rasga e dilacera. ó borboleta, pára! ó mocidade, espera!
Raimundo Correia
A loura Julieta enamorada, Triste, lânguida, pálida, abatida, Aparece radiante na sacada Dos raios brancos do luar ferida. Engolfa o olhar na sombra condensada, Perscruta, busca em torno... e na avenida Surge Romeu; da valerosa espada Esplende a clara lâmina polida... Sente-se o arfar de sôfregos desejos, Estoura no ar um turbilhão de beijos, Mas o dia reponta!... Ó indiscreta Da cotovia matinal garganta! Ó perigo do amor, que o amor quebranta! Ó noites de Verona! Ó Julieta! Publicado no livro Sinfonias (1882). Último da série Perfis Românticos, constituída por oito sonetos.
Raimundo Correia
Do seu fastígio azul, serena e fria, Desce a noite outonal, augusta e bela; Vésper fulgura além... Vésper! Só ela Todo o céu, doce e pálida, alumia. De um mosteiro na cúpula irradia Com frouxa luz... Em sua humilde cela, Contemplativa e lânguida à janela, Triste freira, fitando-a, se extasia... Vésper, envolta em deslumbrante alvura, Ó nuvens, que ides pelo espaço afora! A quem tão longo olhar volve da altura? Que olhar, irmão do seu, procura agora Na terra o astro do amor? O olhar procura Da solitária freira que o namora. Publicado no livro Aleluias (1891).
Raimundo Correia
Dizei-me: é ela a noiva casta e pura, Que no alvor dessa nuvem rutilante, Passa agora? Dizei-me, nesse instante, Turbilhões de translúcida brancura; Colar, broches de pérolas e opalas; Gaza que, em níveos flocos, por formosas, Rijas pomas de mármore, ondulosas Curvas e espáduas de marfim, resvalas... Dizei-me, branca, virginal capela; Nítida espuma de nevadas rendas; Alvos botões de laranjeira; prendas Simbólicas do amor; dizei-me: é ela? É ela a noiva? É mesto, ou prazenteiro, Seu doce olhar? Sorri alegre, ou chora, Seu semblante gentil oculto agora Do espesso véu no alvíssimo nevoeiro? É ela, sim! Su’alma, entre os fulgores Das claras tochas cândidas e ardentes, Nas querúbicas asas transparentes, Voa, festiva, a um tálamo de flores... Mistérios nupciais, só vos devassa Um louco amante! Ao seu olhar ansioso Velais debalde o arcanjo, o astro radioso Que, dentro dessa nuvem branca, passa... Publicado no livro Aleluias (1891).
Raimundo Correia
A Raul Pompéia Tantos triunfos te contando os dias, Iam-te os dias descontando e os anos, Quando bramavas, quando combatias Contra os bárbaros, contra os desumanos; Quando a alma brava e procelosa abrias Invergável ao pulso dos tiranos, E ígnea, como os desertos africanos Dilacerados pelas ventanias... Contra o inimigo atroz rompeste em guerra, Grilhões a rebentar por toda a parte, Por toda a parte a escancarar masmorras. Morreste!... Embalde, Escravidão! Por terra Rolou... Morreu por não poder matar-te! Também não tarda muito que tu morras!
Raimundo Correia
Quando do Olimpo nos festins surgia Hebe risonha, os deuses majestosos Os copos estendiam-lhe, ruidosos, E ela, passando, os copos lhes enchia... A Mocidade, assim, na rubra orgia Da vida, alegre e pródiga de gozos, Passa por nós, e nós também, sequiosos, Nossa taça estendemos-lhe, vazia... E o vinho do prazer em nossa taça Verte-nos ela, verte-nos e passa... Passa, e não torna atrás o seu caminho. Nós chamamo-la em vão; em nossos lábios Restam apenas tímidos ressábios, Como recordações daquele vinho.
Raimundo Correia
Cala-te, esdrúxulo lírico; Teu estro é bandulho hidrópico! Olha as garras de um satírico! Cala-te, esdrúxulo lírico! Teu verso ao leitor empírico Fere de tópico em tópico... Cala-te, esdrúxulo lírico; Teu estro é bandulho hidrópico! (...) Nos teus preitos esquipáticos Citas tanto bardo, — Hipócrates! Citas autores dramáticos Nos teus preitos esquipáticos Citas talentos simpáticos! Citas Camões! Citas Sócrates! Nos teus preitos esquipáticos Citas tanto bardo, — Hipócrates! Muniz! tu causas-nos cólicas! Erudito de catálogos! Pondo as almas melancólicas, Muniz! tu causas-nos cólicas! Faze antes canções bucólicas, Mas nunca preitos análogos! Muniz! tu causas-nos cólicas Erudito de catálogos! Deita antes verso byrônico, Mas, rápido, a velocípede... Sê ferino, sê irônico! Deita antes verso byrônico! Que diabo! Isso é vício crônico! Espanta que sejas bípede! Deita antes verso byrônico, Mas, rápido, a velocípede... Larga essa lira caquética! Ouve! e desculpa esta epístola! Ó professor de dialética! Larga essa lira caquética! Porque antes não curas ética, Pústula, escrófula e fístula! Larga essa lira caquética! Ouve! e desculpa esta epístola!